Mais um
projeto ameaça o arruinado centro histórico de Manaus. Dessa vez o alvo é a
avenida Eduardo Ribeiro. Pretende-se criar uma linha de bondes que subam e
desçam a avenida, do porto ao Teatro Amazonas. Um passeio pelo passado com reprodução teatral de um tempo que
não volta mais. A obra, que certamente custará milhões de reais, tem como
precedente um outro bonde falso, postado
nos arredores do Teatro para servir de pano de fundo às fotos de nativos e
turistas. Pousado no chão, o bonde, no entanto, tem o poder de deslocar-se para
outros lugares e até chegou a aparecer dentro do palco italiano do Teatro
Amazonas. Às vezes volta à Praça ( Largo) de São Sebastião, às vezes, como
agora, desaparece sem dar notícias.
A recriação
“fake” desse passado tem-se fixado no desgastado “tempo áureo da borracha”,
como se a história da cidade começasse e terminasse ali, sem que nada tivesse
acontecido antes nem depois. Em vez de fazer da nossa, uma História cenográfica
onde tudo soa falso, não seria mais importante, sensato e definitivo restaurar
o patrimônio arquitetônico “de verdade” que está a desmoronar na nossa frente
na própria avenida Eduardo Ribeiro, assim como na Getúlio Vargas, na Joaquim
Nabuco e na área do porto?
O prédio do
Ideal Clube , no topo da avenida, por exemplo, é pura decadência, assim como as casas antigas
situadas do outro lado da rua.
Existem
pontos da cidade, onde joias da nossa História e da arquitetura de várias
épocas se despedaçam ao longo dos anos e dos mandatos de governadores e
prefeitos. Um belo exemplo é o cabaré chinelo, que já se pensou em transformar
em um teatro, em um centro cultural , em museu e até em biblioteca, mas
continua ali, como uma mancha urbana, exemplo do desrespeito e da incompetência das autoridades, assustando
e pondo em perigo a vida dos cidadãos. Aliás, aquela área, com o conjunto de
prédios históricos e a praça transformou-se no cemitério da memória.
Passar pela
avenida Joaquim Nabuco dói na
consciência, dá um sentimento de impotência e
uma inevitável sensação de orfandade, de estar vivendo em uma cidade sem
mando e sem lei.
Em geral a
criação dessas cidades cenográficas que acontece em vários países, está ligada à
possível atração do fluxo turístico. No entanto, Manaus é sabidamente uma via
de passagem para o que mais interessa ao estrangeiro: a floresta.
Dois
lugares de rara beleza, seguramente ótimas atrações para o turismo da cidade
estão congelados no tempo, como os
castelos medievais dos contos de fadas. Temos o Mercado Adolpho Lisboa a
contar-nos a História da cidade pela sua arquitetura e função, e a Biblioteca
Pública Estadual monumento imponente do saber amazonense e do nosso interesse
pela leitura. Esses dois prédios estão fechados há muitos anos. Dentro deles
escondem-se segredos que não são revelados a nós que somos os seus donos.
Uma cidade
que possui esses tesouros reais precisa de cenografia?
Nenhum comentário:
Postar um comentário