For he’s a fiend in feline
shape, a monster of depravity.
You may meet him in a
by-street or may see him in the squares
But when a crimes’s discovery, then Macavity’s not there”
( trecho do
poema “Macavity – The Mystery Cat”de T.S. Eliot)
A primeira
vez que vi Tapuia passar correndo com um
passarinho atravessado na boca fiquei chocada. Sabia que gatos comiam pássaros,
ratos e outros seres menores que circulam no jardim. Mas jamais pensei que Tapuia
, tão delicada ,tão doce e tão bem alimentada fosse capaz de uma coisa dessas. Ela
foi criada em casa, com liberdade de sair para a rua, o que fazia todos os
dias, exceto quando entrava no cio, tempo em que era visitada por vários gatos
e gostava de fazer amor no terraço, entre os vasos de plantas, ou no jardim,
debaixo das palmeiras. Um amor ruidoso que durava muitas horas e miados de
muitos decibéis.
É que o
apego aos nossos bichinhos de estimação nos faz perder o sentido do raciocínio
e da realidade de que são animais e, no caso dos gatos, caçadores inatos e curiosos.
Pois bem, acabo
de saber que a minha querida gatinha – espero que Deus a tenha perdoado - se enquadra na categoria dos gatos “delinquentes”-
aqueles que moram com você mas tem liberdade para sair, dar suas voltinhas e depois voltar para casa. Esses, e os gatos “ferais”
- aqueles que vivem soltos pelas ruas- foram rebaixados à categoria de vilões
que ameaçam o equilíbrio ecológico das grandes cidades do mundo.
As
estatísticas levantadas pelos pesquisadores do assunto estão aí: gatos com
tutores ( donos) abatem uma média de 3 a 13 aves e mais 9 mamíferos por ano; já
os “ferais”, aqueles que andam soltos, cantados em prosa e verso pela literatura, como livres e filosóficos,
matam de 38 a 40 aves e de 177 a 300
mamíferos por ano.
Portanto, a
população crescente dos pequenos gatos domésticos ( Felis catus) deve ser contida imediatamente. Ou seja, eliminada, segundo
alguns, em prol de afrouxar o impacto que eles exercem sobre a dinâmica
ecológica. O primeiro a levantar essa bandeira foi o economista neozelandês Goreth Morgan, que esteve
recentemente no Brasil divulgando a sua campanha “Cats to Go”. Pela sua
perspectiva, os gatos domésticos estão ameaçando a vida silvestre da Nova Zelândia.
Imediatamente
outras vozes se levantam para defender o bicho mais charmoso do planeta: são os
amantes dos gatos, cuja campanha se intitula “Cats do stay”.
Para
contrapor-se ao movimento dos “carrascos”, que propõem que os gatos domésticos
sejam mortos ou confinados, os que os defendem também lançam mão dos meios de
comunicação e começam a treinar seus gatos a viver em reclusão ou em regimes
semi-abertos, treinando-os a sair de casa só alguns metros e usar sinos no
pescoço para “avisar”as possíveis vítimas, de sua presença no pedaço.
Há coisa de
uns vinte anos, em uma das minhas viagens a Miami resolvi visitar minha amiga
Glória Carvalho. Havíamos trabalhado juntas no Teatro Amazonas. Ela me recebeu
em seu apartamento. Logo ao entrar levei um susto. Em cada canto, nos lugares
menos possíveis de imaginar havia um gato fazendo pose: em cima da geladeira
estavam dois, negros, de olhos verdes. No
balcão da cozinha uns três, na sua cama uma meia dúzia. Passada a surpresa
inicial, ela me convidou para dar uma volta. Descemos até a garagem carregando
um enorme saco de ração. Ela abriu a mala do carro, lotada de medicamentos e
seringas.
Glória
ligou o carro e me levou a uma praça. A sua presença atraiu uma multidão de gatos
que começaram a miar em uma espécie de saudação felina. Todos a conheciam e ela os conhecia tão bem
que os chamava pelos nomes. Distribuída a ração e administrada a medicação aos doentes,
nos retiramos em direção a outra praça, onde ela distribuiu comida, remédios e
carinho aos gatos de rua ( de praça, no caso).
Gloria era
uma espécie de paraveterinária ( assim como existem os paramédicos dos
humanos). Foi treinada para fazer um primeiro diagnóstico, prestar os primeiros
socorros e cuidar de que aquela população fosse castrada, para evitar uma
explosão populacional. Tudo nos conformes.
Ela recebeu
uma homenagem da Prefeitura pelo seu trabalho, tornando-se uma cidadã ilustre
da cidade.