domingo, 24 de março de 2013

CATS TO GO x CATS TO STAY




Macavity, Macavity, there’s no one like Macavity
For he’s a fiend in feline shape, a monster of depravity.
You may meet him in a by-street or may see him in the squares
But when a crimes’s  discovery, then Macavity’s not there” 
( trecho do poema “Macavity – The Mystery Cat”de T.S. Eliot)






A primeira vez que vi  Tapuia passar correndo com um passarinho atravessado na boca fiquei chocada. Sabia que gatos comiam pássaros, ratos e outros seres menores que circulam no jardim. Mas jamais pensei que Tapuia , tão delicada ,tão doce e tão bem alimentada fosse capaz de uma coisa dessas. Ela foi criada em casa, com liberdade de sair para a rua, o que fazia todos os dias, exceto quando entrava no cio, tempo em que era visitada por vários gatos e gostava de fazer amor no terraço, entre os vasos de plantas, ou no jardim, debaixo das palmeiras. Um amor ruidoso que durava muitas horas e miados de muitos decibéis.
É que o apego aos nossos bichinhos de estimação nos faz perder o sentido do raciocínio e da realidade de que são animais e, no caso dos gatos, caçadores inatos e curiosos.
Pois bem, acabo de saber que a minha querida gatinha – espero que Deus a tenha perdoado -  se enquadra na categoria dos gatos “delinquentes”- aqueles que moram com você mas tem liberdade para sair, dar suas voltinhas  e depois voltar para casa. Esses, e os gatos “ferais” - aqueles que vivem soltos pelas ruas- foram rebaixados à categoria de vilões que ameaçam o equilíbrio ecológico das grandes cidades do mundo.
As estatísticas levantadas pelos pesquisadores do assunto estão aí: gatos com tutores ( donos) abatem uma média de 3 a 13 aves e mais 9 mamíferos por ano; já os “ferais”, aqueles que andam soltos, cantados em prosa e verso  pela literatura, como livres e filosóficos, matam de 38 a 40 aves e de 177 a  300 mamíferos por ano.
Portanto, a população crescente dos pequenos gatos domésticos ( Felis catus) deve ser contida imediatamente. Ou seja, eliminada, segundo alguns, em prol de afrouxar o impacto que eles exercem sobre a dinâmica ecológica. O primeiro a levantar essa bandeira foi o economista  neozelandês Goreth Morgan, que esteve recentemente no Brasil divulgando a sua campanha “Cats to Go”. Pela sua perspectiva, os gatos domésticos estão ameaçando a vida silvestre da Nova Zelândia.
Imediatamente outras vozes se levantam para defender o bicho mais charmoso do planeta: são os amantes dos gatos, cuja campanha se intitula “Cats do stay”.
Para contrapor-se ao movimento dos “carrascos”, que propõem que os gatos domésticos sejam mortos ou confinados, os que os defendem também lançam mão dos meios de comunicação e começam a treinar seus gatos a viver em reclusão ou em regimes semi-abertos, treinando-os a sair de casa só alguns metros e usar sinos no pescoço para “avisar”as possíveis vítimas, de sua presença no pedaço.
Há coisa de uns vinte anos, em uma das minhas viagens a Miami resolvi visitar minha amiga Glória Carvalho. Havíamos trabalhado juntas no Teatro Amazonas. Ela me recebeu em seu apartamento. Logo ao entrar levei um susto. Em cada canto, nos lugares menos possíveis de imaginar havia um gato fazendo pose: em cima da geladeira estavam dois,  negros, de olhos verdes. No balcão da cozinha uns três, na sua cama uma meia dúzia. Passada a surpresa inicial, ela me convidou para dar uma volta. Descemos até a garagem carregando um enorme saco de ração. Ela abriu a mala do carro, lotada de medicamentos e seringas.
Glória ligou o carro e me levou a uma praça. A sua presença atraiu uma multidão de gatos que começaram a miar em uma espécie de saudação felina.  Todos a conheciam e ela os conhecia tão bem que os chamava pelos nomes. Distribuída a  ração e administrada a medicação aos doentes, nos retiramos em direção a outra praça, onde ela distribuiu comida, remédios e carinho aos gatos de rua ( de praça, no caso).
Gloria era uma espécie de paraveterinária ( assim como existem os paramédicos dos humanos). Foi treinada para fazer um primeiro diagnóstico, prestar os primeiros socorros e cuidar de que aquela população fosse castrada, para evitar uma explosão populacional. Tudo nos conformes.
Ela recebeu uma homenagem da Prefeitura pelo seu trabalho, tornando-se uma cidadã ilustre da cidade.