Vi Bibi
Ferreira poucas vezes. No palco, duas. De perto uma vez, ano retrasado, em uma loja de shopping aqui em Manaus, por
onde circulava anonimamente à vontade, antes da estreia de “Bibi canta e conta
Piaf”.
Não deixei
de me emocionar ao ver de perto uma das maiores atrizes brasileiras de todos os
tempos. Como de hábito vestia-se toda de preto, com as pernas dentro de meias pretas também, e os pés metidos em sapatos de
saltos perigosamente altos para a sua idade. Na verdade isso não seria
propriamente uma temeridade pois apoiava-se em um belo homem da sua entourage.
Extremamente acessível e simpática, deu-me um autógrafo onde se desfez em
elogios a Manaus, cidade que não via desde o “Bibi in Concert”, dois anos antes
e - suprema gentileza - tirou os óculos escuros
para me beijar.
A primeira
vez que vi Bibi em cena foi inesquecível. Estava eu no Rio de Janeiro em 1975 e numa das minhas noites cariocas fui ao
teatro Tereza Raquel para assistir “Gota d’Água” de Chico Buarque e Paulo Pontes,
direção de Gianni Ratto ,realização de Oduvaldo Vianna Filho. Só cobras.
Sempre digo
que qualquer espetáculo é passível de esquecimento. Menos o teatro. Fecho os
olhos e vejo com nitidez Bibi na pele da Medeia favelada, a Joana. Magnífica.
Um gigante em cena. Inesquecíveis imagens guardadas para sempre.
A segunda
vez que a vi foi num tempo muito longe da “Gota d‘Água”. Fui ao Teatro Amazonas
para assistir “Bibi canta Piaf”. Nesse espetáculo
que rodou o país, ela demonstrou todo o
conhecimento, adquirido em anos e anos de palco, usando as fórmulas certas de
sedução da plateia. Levou o público para onde quis: dos bulevares de Paris aos
lances mais dramáticos da infeliz Piaf. O público veio abaixo, cantou, aplaudiu
e dançou. Eu, saí com saudade do seu talento dramático, de vê-la em uma
interpretação mais elaborada, mais difícil, mais densa. Mais teatro.
Bibi
Ferreira veio a Manaus pela primeira vez no início da década de 1940
acompanhando o pai, o lendário Procópio. Passou de novo por aqui em 1947, a
caminho de Roraima onde seriam feitas as tomadas de cena do longa metragem “The
end of the River”, do diretor inglês
Derek Twist, baseado na novela “Morte de um homem comum”, de Desmond
Holdridge. No filme ela protagonizou a personagem Teresa, contracenando com o ator
indiano Sabu, no auge da fama. À altura com 25 anos, Bibi também já fazia
sucesso no teatro brasileiro. O filme, porém, não correspondeu às expectativas dos produtores, não acontecendo na bilheteria nem
na crítica. No entanto, não compromete a carreira de ninguém; é bem
feito, bem interpretado e exótico, ao gosto da época. Hoje é considerado um
cult.
Completando
noventa anos esta semana, Bibi Ferreira repete em todas as entrevistas
comemorativas à data, que não pensa em parar de atuar, e dá as razões: primeiro,
porque é o que sabe fazer; depois, porque precisa trabalhar para pagar as suas
contas.
Parabéns,
Bibi, e ainda muita “merda” pra você.