Leyla
Martins Leong
Foi preciso
a força de oito criminosos para consumar o assassinato de uma só árvore. E nem
era uma árvore daquelas enormes que vivem na floresta. Era uma pequena
mangueira urbana que enfeitava e dava sombra aos caminhantes e namorados na
Praça de São Sebastião.
Os oito
carrascos acordaram cedo na manhã de sábado para executá-la. O horário, de
pouco movimento, teria sido ideal, não fossem os olhos atentos dos funcionários
da Rede Rio Mar e de alguns vizinhos madrugadores que testemunharam a morte e
imediatamente a denunciaram nas redes sociais, uma vez que é impossível
qualquer comunicação com órgãos oficiais nos finais de semana.
Encresparam-se
as águas dos defensores da cidade, da Natureza e do cumprimento dos deveres do poder para com os cidadãos. Descoberto
o mandante, veio então a explicação (?): a árvore estava doente e por isso
deveria morrer. Sem tratamento, sem esperanças. Medida drástica e fatal.
E vieram
também as suposições: ela teria sido cortada porque empatava a visão direta do
Teatro Amazonas, fato que estaria estressando os ralos turistas que nos visitam
e precisam voltar para casa com pelo menos uma foto justamente daquele ângulo do Teatro; ou ela, coitada, nasceu no lugar
errado, atravessada no caminho do Auto de Natal; ou ainda, ela teria sido morta
para dar lugar a um novo quiosque de venda de quinquilharias.
O certo é
que essa ação criminosa, que antes passava batida para uma população
indiferente, agora toma novas proporções. Tudo dá a entender que despertamos
do longo sono da leseira baré que nos impediu de protestar diante de décadas de
desmandos que (quase) destruíram a nossa cidade.
Foi assim
que sumiu uma escada caracol toda trabalhada do Mercado Adolfo Lisboa e, de lá
também, um relógio alemão enorme que
dava as horas de frente para o rio Negro, algumas penteadeiras e as portas de madeira nobre e cristal,
trabalhadas sobre o tema do guaraná, que
separavam o hall do Teatro Amazonas do acesso à plateia. Os paralelepípedos de
borracha que forravam algumas calçadas do centro e outras joias da nossa
história. Estátuas, fontes, pavilhões e até bondes somem ou mudam de lugar sem
qualquer explicação. Projetos param de funcionar, centros de cultura fecham,
abrem, são extintos sem que seus gestores se sintam na obrigação de justificar.
Agora o
cidadão aprendeu a cobrar satisfações
dos gastos públicos, dos prazos não cumpridos de obras fantasmas como a
restauração do Mercado Municipal Adolpho Lisboa e da Biblioteca Estadual que,
somados, se estendem por mais de uma década sem explicações convincentes.
Conscientes
da importância da arborização para a beleza e saúde de uma cidade que tem tudo
para ser feliz, o povo protesta. O replantio de 500 árvores não compensa a
morte de uma sequer, pois a Natureza é única em seu equilíbrio. Os gastos
exorbitantes com os trens da alegria dos viajantes oficiais que dizem
estar promovendo a imagem do Amazonas no exterior ( com o nosso dinheiro, é
claro) não compensam nem chegam aos pés do efeito positivo da preservação dos
bens públicos e do respeito aos cidadãos e à cidade.
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